AO MINUTO

Estatísticas e a mensagem que desejamos comunicar


Numa conhecida citação atribuída a Disraeli, Mark Twain afirmou que “Existem três espécies de falsidades: as mentiras, as malditas mentiras e as estatísticas”. Este pensamento surge à luz de um magnífico artigo escrito pelo Professor Manuel Caldeira Cabral na revista “Visão” a 9 de Maio.

Analisando vários dados estatísticos relativos à evolução da economia portuguesa desde o início do século, o autor sugere que o PIB per capita de Portugal, medido em termos de paridade do poder de compra, poderá ter ultrapassado o Japão em 2023. Adicionalmente, indica que se a tendência de crescimento observada nos últimos oito anos for mantida nos próximos sete, até 2030 poderemos ter ultrapassado a Espanha e estaremos muito próximos de França, Reino Unido e Itália.

Que surpresa isso seria. Portugal ultrapassar o Japão em termos económicos?! Como é possível? Não estávamos prestes a ser ultrapassados pela Hungria e pela Roménia? Já não tínhamos sido deixados para trás pela Lituânia, pela Chéquia, pela Polónia, etc.? As estatísticas…

A questão reside nas estatísticas selecionadas e na mensagem que pretendemos transmitir. É um facto que vários países que aderiram à União Europeia em 2004 registaram, no mesmo período, taxas de crescimento do PIB superiores às de Portugal, o que resultou em sermos ultrapassados por eles, teoricamente enriquecendo mais do que nós. Pelo menos, em termos estatísticos.

Diversas razões justificam o porquê de termos crescido mais lentamente do que a Polónia, a Chéquia ou os Países Bálticos. Um fator crucial é a orientação macroeconómica adotada. No entanto, existem outros motivos. Estes países possuíam populações mais qualificadas. Além disso, beneficiavam de uma localização geográfica que facilitava o acesso aos principais mercados. Tinham uma base industrial mais robusta, embora historicamente menos eficiente. Isso permitiu-lhes focarem-se em aumentar a produtividade através da produção de bens de alto valor acrescentado, ou seja, melhorar o valor da produção.

A Hungria, com dimensões semelhantes às de Portugal, acolhe fábricas da Mercedes-Benz, da Audi, da BMW, da Suzuki e tem em vista a instalação em breve da BYD, uma marca chinesa de veículos elétricos. Por outro lado, a Roménia apresenta a particularidade da modernização económica ter sido acompanhada por uma redução de cerca de 15% da sua população. Como não haveria de crescer rapidamente o seu PIB per capita?

Contudo, isto não implica que Portugal esteja a empobrecer. Simplesmente significa que, neste período, crescemos a um ritmo inferior a esses países e a outros. No entanto, continuamos a expandir-nos. A questão fundamental incide sobre a baixa produtividade da economia portuguesa, a qual deriva do reduzido valor daquilo que produzimos, impedindo que a economia obtenha os recursos necessários para melhorar a distribuição de riqueza. Uma verdadeira reformulação económica deve começar por atacar esta questão.

Adicionalmente, devemos rever as estatísticas que empregamos e que nos avaliam. As nossas estatísticas ignoram o significativo valor não declarado da economia informal, que representa riqueza existente, mas sobre a qual não podemos intervir devido à falta de informações e ferramentas para tal. E assim, regressamos à citação de Mark Twain atribuída a Disraeli, com a qual iniciámos este artigo.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.





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Asraful Shohag

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